E ao terceiro dia, José Luís Carneiro ressuscitou
Em poucas semanas, deu-se uma reviravolta no panorama político nacional que poucos conseguiram prever. A queda do governo maioritário de António Costa e a subsequente convocação de um Congresso Nacional abriram a caixa de pandora das mais profundas discórdias partidárias que, desde 2015, se encontravam já mitigadas por força das sucessivas vitórias do Partido Socialista. De entre os fragmentos resultantes da queda, Pedro Nuno Santos foi o candidato que mais depressa consolidou um conjunto de peças fundamentais na construção de um novo projeto político para o Partido – mas a cola que os unia provou ser menos resistente ao tempo do que seria previsível.
Para todos aqueles que têm vindo a acompanhar a corrida à liderança do Partido Socialista, não será inédito abordar o tema da súbita ascensão de José Luís Carneiro. A sua candidatura a Secretário-geral do Partido, condenada e ostracizada à nascença pelos mais diversos setores e tendências (inclusivamente por algumas das principais figuras-chave da denominada ala moderada do Partido Socialista), conseguiu desafiar toda e qualquer expectativa dos “suspeitos do costume” nos mais diversos espaços de comentário político do nosso país ao afirmar-se como a grande alternativa ao projeto político de Pedro Nuno Santos. Em escassas semanas, José Luís Carneiro alcançou o inimaginável ao consolidar um vasto leque de apoios não apenas dentro da classe política, mas sobretudo junto dos militantes de base que, dia após dia, manifestam o seu apoio à sua candidatura.
Apesar da ascensão de José Luís Carneiro como candidato ter sido interpretada de modo recorrente como improvável, é imprescindível salientar o papel crucial do seu mérito pessoal que, em toda esta corrida, se configurou como o seu maior aliado. A realidade é que, ao longo de vários anos no exercício de funções governativas e partidárias (nomeadamente como Ministro da Administração Interna e como Secretário-Geral Adjunto do Partido Socialista), José Luís Carneiro provou a sua competência e capacidade de trabalho numa pasta ministerial de responsabilidade e dificuldade acrescidas e, também, em circunstâncias da vida partidária de complexa dureza e exigência. Se a sua competência, por si, contribuiu de forma esmagadora na perceção predominantemente positiva diante da opinião pública, foram a sua humildade e proximidade ao cidadão comum que conquistaram fortes apoios e respeito em todo o espectro político.
Numa era rendida ao dogmatismo e ao extremismo ideológico, José Luís Carneiro prova que ainda é possível, sim, fazer política popular, mas nunca populista; ponderada,
mas nunca conservadora; enérgica, mas nunca impulsiva; inovadora, mas nunca
precipitada; e acima de tudo corajosa, mas nunca imprudente. O povo português exige
hoje como prioridade governativa a estabilidade, e encontra amplamente nesta
candidatura (como, aliás, as sondagens realizadas até hoje o indicam) a resposta a esta
grande agonia que assombra o nosso país.
Muitas vezes, na esmagadora maioria dos partidos e associações dos mais diversos
tipos e feitios, é possível verificar um curioso (embora infeliz) fenómeno – vemos que o
militante de base, numa ótica coletivista e, por vezes, até pré-determinista, desconsidera
o seu próprio poder para impor a mudança no partido que integra. O princípio democrático
do voto direto, secreto e periódico é assombrado pela aparente força de grupos de
interesse partidários que, somando dezenas de votos no seu arsenal eleitoral, usurpam
todo e qualquer vestígio de democracia nas instituições. Afinal, qual é a força de um único
voto? Que diferença fará um voto num vasto universo de milhares e milhares de eleitores?
Diz-nos a ciência política, pela pesquisa de Erica Chenoweth (professora na Harvard
Kennedy School), que o esforço ativo de apenas 3.5% de uma determinada população se
configura como suficiente para garantir uma mudança política profunda e significativa –
e, também nestas eleições internas, será a força da dita maioria silenciosa a determinar o
desfecho da corrida. Se dúvidas restavam sobre a força de cada voto, somos agora capazes
de chegar à mais clara das conclusões – será o militante de base, em plena consciência de
voto, a decidir o rumo do Partido Socialista e do País.
Artigo de: Diogo Faria
Jurista
Excelente análise Diogo