Dia Internacional da Rapariga – Uma igualdade longe de ser alcançada

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O Dia Internacional da Rapariga tem por objetivo sensibilizar para as questões de igualdade e violência de género, bem como apelar à reflexão sobre os preconceitos e estereótipos que colocam entraves na vida das raparigas. Procura, também, dar ênfase ao papel ativo que as raparigas podem ter enquanto agentes de mudança social. Esta data foi assinalada pela primeira vez a 11 de outubro de 2012, porém, até hoje, a igualdade está longe de ser alcançada.

Durante séculos, a mulher padeceu de uma invisibilidade social. Não tinha uma voz ativa até ao momento em que o ensino obrigatório começou a preparar igualmente homens e mulheres para a cidadania. A partir do século XIX, a par da reivindicação pelo direito à instrução, as mulheres lutaram pelo direito ao trabalho remunerado e, no século XX, a sociedade passou a perspetivar a mulher como um ser cultural e não apenas como um ser da natureza. Nessa mesma época, a mulher conquistou progressivamente o direito ao voto, a igualdade em termos legislativos, a entrada em grande escala no mercado de trabalho, o acesso a vários níveis de ensino (incluindo o ensino superior), a libertação do corpo, o direito à saúde sexual e reprodutiva e a ascensão a cargos públicos e políticos (incluindo o de Presidente da República), embora nos dias de hoje subsistam focos de discriminação. Em 2023, a Mulher tem, ainda, que provar ser merecedora do lugar que ocupa, desdobrando-se em esforços para comprovar que é capaz.

A desigualdade é ainda mais marcante, quando abordamos as questões do papel da Mulher de etnia cigana. Com a particularização crescente das sociedades modernas, ajustadas ao ideal de democracia, defende-se a igualdade de género entre homens e mulheres. Contudo, na vida quotidiana, romper com valores remanescentes de uma sociedade tradicional patriarcal tem sido um processo difícil de concretizar.

Desde crianças, a educação é diferenciada, sendo as raparigas ensinadas a serem subordinadas aos rapazes. Em meninas obedecem aos pais, depois também aos irmãos e, com o casamento, a submissão das Mulheres ciganas aos homens continuam com a deslocação para as famílias dos maridos. Em todas as suas atividades, as raparigas são vigiadas, como por exemplo, quando vêm televisão não podem assistir a qualquer tipo de programa, sendo sempre acompanhadas por um familiar. As regras são mais ou menos rígidas, consoante a família. As meninas aprendem desde cedo a tomar conta da casa e dos irmãos mais novos. É preceito tradicional da etnia cigana as meninas abandonarem a escola quando entram na puberdade, sem cumprirem o que está estipulado por lei em termos de escolaridade obrigatória. Os membros da etnia consideram que elas não precisam de tal formação para desempenhar os papéis de esposas, mães e educadoras dos filhos em função dos princípios étnicos, que por esta mesma tradição lhes estão destinados.

Desde sempre as raparigas são educadas no sentido de cumprirem com o dever permanente com a família em detrimento de si próprias, o que leva a que hábitos de produção do corpo, dietas e tratamentos de beleza sejam menos comuns após o matrimónio, que ocorre mais cedo em comparação com os jovens da sociedade maioritária. Contudo, a questão da obrigatoriedade da Mulher cigana em submeter-se aos imperativos da tradição não é, geralmente, entendida por elas como uma forma de submissão. A importância dada às questões da virgindade fá-las sentirem-se fortes e valorizadas pela etnia e pelos homens da comunidade, e moralmente superiores às mulheres da cultura maioritária.

No que respeita à situação de viuvez, a Mulher é mais uma vez colocada em desvantagem comparativamente ao homem. O homem viúvo pode sempre contrair um novo matrimónio, já a mulher, apenas quando a viúva é jovem e sem filhos, é-lhe permitida uma nova relação. Urge referir que este poder é exercido de forma invisível perante o olhar masculino, concedendo a este uma ilusão de total dominação sobre o género oposto. No que diz respeito à esfera pública, a sua autonomia ainda não é muito notória, mas as coisas estão a mudar progressivamente. Quando é necessário intervir para resolver problemas com instituições extracomunitárias (segurança social, finanças, escola, etc.), continuam a ser as mulheres ciganas responsáveis pela sua resolução.

Em jeito se síntese, as Mulheres ciganas debatem-se com problemas de género, subjugadas por uma tradição cultural cigana machista, por se atribuir uma valorização maior ao papel social do homem que se repercute no papel de submissão imposto às mulheres ciganas. Este papel de subordinação é uma constante ao longo do seu ciclo de vida. Os elementos do sexo masculino têm mais liberdade de circulação e de interação com elementos da sociedade maioritária, o ‘Outro’, nomeadamente, com mulheres não ciganas. A desigualdade de género surge desde o nascimento, sendo por isso mais valorizado o nascimento de um rapaz por se entender ser motivo de menores preocupações.

É indispensável sensibilizar a sociedade portuguesa para a discriminação do papel da Mulher, nomeadamente na etnia, de forma a favorecer a sua autonomia intra e extra comunitária.

Autora: Ana Barroso

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